terça-feira, 26 de setembro de 2017

A MULHER DE CIMA

– Cem.
         – O quê?!
         – Tu ouviu.
         – Mas eu só quero um instantinho!
         – É o preço do instantinho.
         – Hã?!
         – É pagar ou largar.
         – Você tá brincando...
         – Não tô. É o meu preço e pronto.
         – Mas com essa crise toda?!
         – Que crise?
         – Em que mundo você vive, mocinha?
         – No mundo da rua. E não me chame de mocinha; detesto.
         – Não será no mundo da lua?
         – Hem?
         – Deixa pra lá.
         – Tá bom, tá bom. Oitenta, vai.
         – Não tenho essa grana toda.
         – Tem quanto aí?
         – Vinte.
         – Só isso?!
         – Ali em baixo é só quinze; acabei de perguntar.
         – Lá em baixo não é aqui.
         – Aí, quer saber? Vou embora.
         – Pode ir.
         – Nunca mais apareço aqui.
         – Tá.
         – Não volto nunca mais mesmo!
         – Sei.
         – Lá embaixo até posso ir... Aqui, não!
         – Já sabia.
         – Adeus!
         – Tchau.
         O homem, decidido e furioso, acelera os passos pela calçada.
         Da esquina, ele se volta e grita para a moça:
         – Aí, vou te falar uma coisa!
         – Fala!
– Você é o cão de linda!
A moça balança a cabeça, enquanto tira o estojo de maquiagem da bolsa.
– O cão de linda, viu?
O homem repete, choroso. E desaparece de vez na esquina escura.

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

A ÂNSIA E O TEMPO

quem sabe à noite
(ou mesmo à luz do dia);

pode durar duas horas,
ou poucos minutos, até;

ou, talvez, um simples
milésimo de segundo –

para, em ânsia louca,
gozar, gozar, morrer...

e, naturalmente, viver,
renascer também...

o tempo todo, sempre,
para sempre, amém!